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Me manda a receita?

  • Foto do escritor: FiGAS
    FiGAS
  • 3 de mai. de 2021
  • 3 min de leitura

Estava lá eu, com um bebê no colo, fone de ouvido desaparecido, dando aquela conferida no celular pelas redes, quando apareceu uma receita que eu procurava há tempos! Viva, viva! Parecia ser aquela que eu ia chamar de minha, brilhei os olhos, abri o link, e era um vídeo, e sem legendas.


Se você não tem crianças, eu explico a regra de ouro: não se acorda o bebê! E no que isso implica? Que se o infante dormiu em cima de você, aquela será sua posição por horas. Sem água, sem banheiro, com peito disponível (no meu caso), e no melhor silêncio possível. Se a posição muda um pouco, é choro e frustração na certa. A gente aceita, toca a vida e confia que vai passar. E passa.


Bom, sendo assim, não ia dar para ouvir a receita no vídeo, muito menos sair pausando toda hora para anotar tudo. Digitei nos comentários perguntando se a pessoa iria colocar a receita escrita também, e a resposta foi que tinha dado um trabalho danado fazer o vídeo, e o mínimo que eu podia fazer era assistir.


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Esse episódio me marcou. Na época fiquei tão chateada, que deixei a receita de lado e já nem lembro em que página foi, mas hoje, alguns anos depois eu consigo compreender a posição dela. É uma trabalheira a tal da receita, gente! Filmar lindamente então, uma dedicação imensa. E ao final, exausta, tudo que se quer é que as pessoas assistam e gostem e testem em suas cozinhas.


O que mais vejo em páginas de comidas e receitas são perguntas do tipo ‘Posso trocar x por y?’, ‘se eu fizer de outro jeito vai funcionar?’, ‘qual a função desse ingrediente?’...

E recentemente percebi um movimento de quem posta, já colocar na receita mensagens como ‘troque pelo que tiver em casa’, ‘x não substitui y’, ‘não tenho as respostas, faça o teste’...

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Fazer o teste. Eis aí o x da questão. Testar em sua cozinha implica em alguma autonomia. Quer dizer que você vai lá, vai substituir, vai tentar, vai errar, vai acertar, vai trocar e vai achar o seu jeitinho. Jeitinho esse que é a definição de sua expressão ao cozinhar.


Antigamente eram os cadernos de receitas com a receita escrita à mão. Vieram os livros, agora com fotos, uma ideia bonita e iluminada de como ficaria a receita em sua casa – o início das frustrações – depois os programas de receitas, a pessoa cozinhando ao vivo, tudo preparado e organizado, algo que na vida real leva horas, na TV fica pronto em minutos com uma produção impecável e louça lavada, e aí chegaram as receitas na internet, com fotos ainda mais trabalhadas e incríveis, e por fim os vídeos, aos milhões, e em poucos segundos receitas trabalhosas ganhando vida e forma, como se assim fosse, num passe de mágica quase.


Michael Pollan, em seu livro ‘cozinhar’, lançado em 2013, fala sobre o tempo que se gasta assistindo programas de culinária versus o tempo que se passa cozinhando. 2h para a TV e 20 min para a cozinha. Imagine hoje, 8 anos depois e com o boom dos vídeos acelerados, como não estará esta proporção?! Consome-se muito conteúdo de comida, mas cozinha-se quase nada.

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É fato que desde março de 2020 com a necessidade de se estar em casa, a cozinha ganhou nova posição no ranking residencial, e quem não a visitava muito não teve como escapar, pois preparar a própria comida se tornou essencial. A busca então por conteúdos explicativos subiu rapidamente, aprender a cozinhar em segundos, igual no vídeo da rede social se torna o objetivo.


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E a ficha cai: Nada, nadica de nada nessa vida é acelerado assim. Tudo leva tempo. O tempo te aprimora e te faz melhor, o tempo cura, o tempo é senhor das coisas. Leva tempo para aprender, para compreender, para pôr em prática, para preparar, para assar, para saltear, para dourar ou para marinar, para fermentar. É preciso planejar, é preciso organizar, é preciso listar, é preciso comprar. É preciso esperar. É preciso respirar. Inspire. Expire. Respire.


Tempo. Dê tempo ao tempo, respeite o tempo alheio e faça bom uso de seu tempo. Há um tempo para tudo.








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5 comentários


Bruna de Almeida Leite
Bruna de Almeida Leite
17 de mai. de 2021

Eita que texto porreta! Era o que eu precisava ler! Obrigada, Rebeca!

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Carla Michely Yamaguti Lemos
Carla Michely Yamaguti Lemos
03 de mai. de 2021

Adorei seu texto, Rebeca! Sinto mesmo que o tempo é o senhor das coisas. Tenho procurado me dedicar a uma atividade de cada vez - cozinhar inclusive -, com a mente mais calma, para ver se esse senhor anda mais devagar... Beijo grande e saudades!

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bomdia.figas
bomdia.figas
04 de mai. de 2021
Respondendo a

Ei Gabi! que bom te ler aqui!


Todo dia cansa bastante mesmo, por aqui rola um planejamento semanal para ter alguns dias sem cozinha, outros com comida a mais para congelar e por aí vai...


Sim, a cultura do desperdício é algo extremamente urgente de ser modificada!


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